História da primeira brasileira a empreender na Tailândia
Como Isa Gama faturou R$ 1M com um negócio que começou ao acaso.
No. 18 — Julho, 2024.
O começo
Isabella Gama Loureiro é engenheira, empreendedora, escritora e palestrante. Em 2018, fundou uma traveltech do outro lado do globo, na Tailândia. O que começou no Whatsapp, com um investimento de 0 reais, faturou mais de R$1M em menos de dois anos. O que esta história nos ensina? Boa leitura!
A empreendedora, escritora e palestrante Isa Gama. Foto: Linkedin
Quando era tudo verdade
Ko Phi Phi/ Tailândia, 2016.
Isa desembarca em um país asiático pela primeira vez, sem imaginar o impacto que sua jornada teria. O plano inicial de ficar duas semanas já tinha mudado para: tempo indeterminado.
A ideia era encontrar qualquer tipo de trabalho e ir ficando. Aquilo que muita gente chama de recomeçar. Tentar uma vida nova - já que as amarras anteriores não existiam mais.
Um ano e meio depois, o faturamento do negócio que criou aproveitando a oportunidade que apareceu bateu R$1 milhão. O investimento inicial? 0.
O que começou como uma ajuda descompromissada a turistas que chegavam na região, tornou-se uma startup de viagens que intermediava passeios por todo o sudeste asiático.
“Quando as coisas estavam no automático, foi meu auge.
As pessoas achavam no Google e compravam sem intermediação nem campanhas de mídia. Eu tinha certeza qua ia dar certo.”
E deu. Foram mais de 4.000 clientes.
Se você viajou pra lá neste período, há uma grande change de seu hotel, transporte ou passeios pelas mais bonitas paisagens terem passado pelas redes da Tours Phi Phi.
Esta edição conta a história da primeira brasileira a empreender por lá, escalando sozinha um negócio que começou com um celular “velho” e dentro do Whatsapp.
Sozinha. Pausa para dar a ênfase que a informação merece ao valorizar um feito impressionante. Ao longo do texto, talvez esta informação faça mais sentido.
O que levou a empreendedora a parar no meio do caminho?
Do Sul de Minas para tentar a sorte na Ásia
Como uma engenheira civil vinda do interior foi parar do outro lado do mundo?
Isa nasceu em Três Corações, no sul de Minas Gerais. Foi estudar na capital; mas Belo Horizonte ainda trazia um sentimento de “estar presa”, sem conseguir enxergar além dos limites da cidade pequena em que foi criada.
A zona de conforto nunca foi seu lugar preferido. Durante a faculdade de Engenharia Civil, trabalhava na Caixa Econômica Federal e abriu mão da estabilidade porque ganhar experiência na sua área era a prioridade.
Uns anos depois, já atuando como engenheira, entrou em uma leva de demissões da empresa e usou parte da rescisão para fazer um mochilão e expandir seu olhar sobre o mundo.
Ao descobrir um universo vasto e cheio de possibilidades, uma sementinha é plantada dentro de você por tempo indeterminado. Vale o mesmo para o empreendedorismo*.
Quando retornou da aventura, arriscou-se em sua primeira empreitada como empreendedora, abrindo um Escape Room; que não deu certo.
“Não tinha experiência nenhuma, faltava conhecimento”.
Voltou ao mercado de trabalho por mais alguns anos, enquanto aprofundava seu conhecimento em negócios. Também tornou-se voluntária na Fundação Estudar, para ganhar prática. A ideia de tentar novamente sempre esteve presente, e mais uma vez, as circunstâncias moldaram o seu caminho.
Isa se viu sem emprego novamente. Mudar os planos da viagem já marcada para a Tailândia não era uma opção. Todas as ideias e inseguranças do futuro apontaram para um “vou experimentar”.
Sem mais nada que a prendesse por aqui, embarcou com a ideia de encontrar qualquer trabalho e vendo onde a coisa ia dar.
Como uma startup surge de um grupo no Whatsapp
Quando desembarcou em Koh Phi Phi, logo começou a trabalhar em uma balada para pagar as contas. Mais estabelecida, notou uma oportunidade dentro dos vários grupos de viagem que participava: os brasileiros trocavam muitas dicas sobre os melhores roteiros da região.
Interagindo com os turistas, percebeu que a quantidade de horas que gastava nestas trocas era um forte indício de que gostava de conectar estes pontos.
E se eu começar a intermediar hospedagem, passeios e ganhar comissões?”
Ajudar as pessoas a ter uma viagem dos sonhos surgiu como um novo propósito e Isa foi conversar com empreendedores locais para fechar acordos. Assim, começou a fazer a ponte turista-serviço e o dinheiro começou a entrar. Tudo pelo celular.
Em pouco tempo, Isa já organizava passeios próprios e ganhava metade do que entrava. Não mais uma comissão fixa, mas lucros divididos. Um dos parceiros tailandeses chegou a comprar um barco, animado com o crescente fluxo de brasileiros.
Também começou a fazer parceria em Laos, Camboja, Bangkok, Mianmar, Malásia, intermediando passeios no Sudeste Asiático inteiro.
A empreendedora só investiu em estruturar a operação no meio do caminho. Comprou um computador quando a demanda extrapolou o Whats e assim o negócio se oficializou com site, redes sociais e fluxo de caixa organizados.
Primeiro, criou uma página gratuita pelo Wix. Depois, para integrar um calendário, migrou para o WordPress. Foi mexendo, aprendendo, testando e sendo criativa com as oportunidades que apareciam.
"Quando chegava um programador na ilha, oferecia passeios de graça em troca de ajuda. Em pouco tempo, o site estava bem estruturado."
Agências de viagens também tornaram-se clientes, impulsionando ainda mais o faturamento.
Durante dois anos, o negócio cresceu significativamente. As vendas, antes feitas individualmente, passaram a ser automatizadas. Isa praticamente não investia em mídia. Ganhava clientes por indicação, através das redes sociais e por buscas orgânicas no Google.
A escala estava acontecendo e logo bateu R$1 milhão em faturamento. Isa passou a ser respeitada pelos empreendedores locais. Donos de barcos, pousadas e outros serviços tinham agora uma importante parceira de negócios.
“No começo, eles não tinham muito a perder. Se trouxer cliente, ótimo.
Quando eles viram o fluxo que eu gerava, virei uma parceira estratégica.”
Isa nunca trabalhara tanto na vida e a demanda não parava. Precisava de ajuda e este era o maior gargalo porque dependia de brasileiros dispostos a ficar por mais tempo na Tailândia; mas a rotatividade era alta.
Contratos fixos eram mais complexos já que pela lei, para contratar um estrangeiro, é preciso ter três locais na operação. Além disso, para qualquer negócio ser estabelecido por lá, um tailandês precisa ser dono de pelo menos 51%.
Isa não queria essa opção; mas sim o negócio estabelecido no Brasil, com a operação na Tailândia.
Determinada a acelerar, foi buscar mentorias especializadas e entrou no Inovativa em 2019, com a expectativa de entender como estruturar melhor o negócio e buscar investimento.
Até os ventos mudarem.
Pausa.
Um dos passeios que a empreendedora vendia na ilha. Via Instagram.
Valorize os feitos de uma mulher empreendedora
Ou: dá para ser menos medíocre enquanto homem de negócios
A jornada da Isa foi marcada por desconfiança. Até hoje, sempre que compartilha sua história em eventos e rodas de networking, as conquistas profissionais parecem invisibilizadas por indagações um tanto desrespeitosas.
“As pessoas sempre apontam para o homem que supostamente estaria por trás. Cansei de ouvir e responder:
‘Você se apaixonou e ficou por lá? ou “Mas tinha um sócio por trás, né?”
É irônico que Isa seja mais respeitada como empreendedora na Tailândia do que no Brasil.
Como esta humilde escritora de newsletter também gerenciou um negócio 100% tocado por mulheres e já viveu situações absurdas, me darei o direito de ser enfática neste tema que me toca muito.
Invisibilizar o que você pode aprender ao trocar com uma empreendedora porque a única coisa que lhe interessa (ou o primeiro pensamento que surge) é:
Descobrir quem é o homem que está por trás do negócio. Ou
A razão amorosa que deu início ao projeto.
É tão, mas tão pequeno**. Por favor, tenha isso em mente sempre.
Podemos mais como sociedade.
Pronto, agora voltemos.
Parando no meio do caminho
Covid-19.
Para quem é do setor de turismo (e eventos, como foi meu caso!), acredito que reviver este período é como mexer em um trauma ainda em andamento.
Vou continuar o texto em respeito ao leitor, mas todos sabemos o que aconteceu: tudo parou. Isa viu a operação congelar e também precisou devolver o dinheiro de pacotes já fechados. Você pisca e o caixa zera.
Estava no meio da aceleração do Inovativa e tinha altas expectativas de que os resultados chegariam.
“Nunca imaginei falir e, do nada, isso aconteceu.
Eu tinha criado um negócio em um mercado totalmente novo e acreditava que teria apoio no Brasil para conseguir continuar.”
No processo, tentou captar investimentos, mas enfrentou resistência dos investidores em colocar dinheiro em um país desconhecido - apesar do modelo de negócio validado e faturando.
Tudo isso culminou em um ponto de ruptura.
Era hora de recomeçar.
Isa compartilha sua jornada como empreendedora e viajante por mais de 20 países no livro Você Ousa Sonhar? Imagem: Instagram.
Os aprendizados
O que você faria igual se fosse começar um novo negócio?
Manter a mesma dedicação e resiliência. A empreendedora não poupou esforços e criatividade para fazer acontecer; desbravando potenciais conexões e parcerias em situações cotidianas que à primeira vista poderiam nem fazer sentido.
O que faria diferente?
Não colocar pessoas no coração da operação. Isa confiou em parceiros que posteriormente a prejudicaram e fica o sentimento de indignação, frustração e ter levado “algumas facadas pelas costas”.
5 Erros ou conselhos
que daria para você hoje ou para quem quer cometer outras falhas; não as que estão nesta edição:
Coloque a sua cara pro mundo. Isa ficou escondida nos bastidores e sente que parte dessa história está apagada; não existe. Arrepende-se de não ter criado mais visibilidade sobre seus feitos enquanto aconteciam.
A máxima de “eu crescendo todo mundo cresce’ é uma falácia. Confiou demais nas pessoas e não estava preparada para boas intenções não serem recíprocas. Nem todo mundo compromete-se em parcerias ganha-ganha.
Expectativas vs. Realidade de Mercado. Entenda as possibilidades antes de criar expectativas. Com o negócio faturando na casa do milhão, acreditou que seria mais fácil do que realmente é; acumulando frustrações.
Não deixe a síndrome da impostora tomar conta. Apesar do orgulho das conquistas e da trajetória, ainda sente-se com menos valor por não ter tido o sucesso que o negócio poderia trazer e isso paralisa algumas áreas da vida.
Tenha sócio homem desde o início. Acredita que teria mitigado muita desconfiança e descrédito se não fosse uma mulher sozinha no negócio, alcançando resultados melhores.
O depois
“Quero contar o que aconteceu para ver se consigo entender que tem coisas boas em tudo o que fiz”
Isa quer ultrapassar a sensação que não é suficiente. Busca entender o valor das experiências que viveu, mesmo quando sente-se insatisfeita e marcada pelo estigma do fracasso.
(Por isso, esta news existe e acredita que falar, dar voz e contorno é importante como forma de processar e valorizar a jornada individual de cada empreendedor.)
Uma das suas causas é instigar a pessoas a lerem mais, sem perceber que o estão fazendo. Já tinha escrito um livro quando a pandemia a obrigou a encerrar o negócio e disponibilizou o livro inteiro no Instagram, em mais de 1.000 post podem ser lidos aqui.
Também tentou criar uma estratégia de negócios para o projeto. Apesar dos esforços, como a tentativa de captar recursos pela Lei Rouanet - que teve R$ 200k aprovados - e a participação no programa do SEBRAE para Economia Criativa, Isa enfrentou novos desafios.
“Isso também foi um fracasso. Até hoje sinto que, desde que essas coisas começaram a dar errado com o negócio e o livro, não consegui mais.”
Ainda está no processo de como se recolocar no mundo, pensando no que mais pode tentar. Uma coisa é certa: está acostumada a atuar longe da zona de conforto - onde encontrou espaço para explorar seu verdadeiro potencial e se libertar das expectativas e papéis que carregava.
Conecte-se com a Isa no Linkedin e no site do seu projeto Você Ousa Sonhar?, onde aplica sua trajetória como inspiração para quem também quer explorar novas fronteiras.
Obrigada pela generosidade em contar sua história e inspirar outros (as) empreendedores (as).
Tem muita vida após o ‘não chegar lá’, o problema é o processo. Espero que esta edição tenha inspirado um pouco.
Até a próxima história!
(Sigo em busca de novos casos para contar. Me indiquem, principalmente negócios de mulheres e/ou startups de base tecnológica! :) )
Nati.
Leia a edição #17 aqui.
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🔗 O que andei lendo e que pode inspirar você e seu negócio:
O mapa das traveltechs brasileiras detalha quem usa a tecnologia em viagens no Brasil. ✈️
Rotinas são para robôs. Este texto traz ideias de como maximizar seu impacto sem aquele papo de rotina monótona e automática. (em inglês) 🕰️
De arrepiar esta campanha da Nike já entrando em clima olímpico. 🏅
A história de um empreendedor que planeja abrir 10.000 pequenos negócios e dar para cada funcionário uma quantia significativa de participação. (em inglês) 🫱🏽🫲🏿
Exercitar ser muito ruim em algo pode desencadear um novo processo criativo aí dentro. ⛓️💥
🔗 Links para ajudar o Rio Grande do Sul:
Maior faxina da história. App conecta quem precisa de ajuda com quem pode ajudar. 🧹
Centenas de animais resgatados precisam de lares, comida, remédios. 🐶
Quer comentar, contar sua história ou dar um feedback? Escreva para failwisebrasil@gmail.com ou preencha este formulário.
→ Esta história foi 94% escrita por inteligência real, não artificial. :)
*Falando por mim - nasci e morei 17 anos em uma cidade de 5.000 habitantes e quando descobri que o mundo é grande, algo se expande de forma imensa e descompassada com o conhecimento que você tinha até então. Não há retorno.
** Na dúvida do que conversar com uma empreendedora? Aqui vai uma lista de perguntas que você pode fazer - tenho certeza que há muito espaço de troca e que você também pode aprender várias coisas. Garanto.
Qual foi a sua motivação para começar esse negócio?
Quais foram os maiores desafios que você enfrentou no início e como os superou?
Como você escalou a operação? Quanto investiu?
Quais estratégias você usa para atrair e manter clientes?
Como você se mantém atualizada com as tendências do seu setor?
Você pode compartilhar alguma história de sucesso que destacou o impacto do seu trabalho?
Como você identifica oportunidades de mercado para expandir o seu negócio?
Como você gerencia a equipe e garante a produtividade no dia a dia?
Qual foi a sua maior conquista até agora como empreendedora?
Que conselhos você daria para outras pessoas que estão pensando em iniciar seus próprios negócios?
Quais inovações ou novos produtos/serviços você está planejando para o futuro?
Como você equilibra as demandas profissionais e pessoais enquanto lidera seu negócio?
Você pode falar sobre algum projeto recente que a sua empresa realizou com sucesso?
Quais parcerias ou colaborações têm sido fundamentais para o crescimento do seu negócio?
Como você mede o sucesso do seu negócio além do lucro financeiro?