A startup que era uma feature
História da Valor da Obra, uma construtech com uma impressionante solução, mas que não chegou lá.
No. 22 — Setembro, 2024.
O começo
Vinicius Reis é especialista em inovação e mentor de startups. Seu primeiro negócio, Valor da Obra, calculava com uma impressionante precisão quanto iria custar uma construção. Entre apostar tempo integral e encerrar o projeto, optou pelo segundo. Os aprendizados você lê agora!
O empreendedor Vinicius Reis. Foto: Linkedin.
O que era a Valor da Obra
A Valor da Obra foi uma plataforma online que calculava o custo total de uma construção com uma margem de erro de apenas 2%. O objetivo era trazer mais previsibilidade em um setor onde é comum orçamento serem extrapolados pelas mais diversas razões.
O usuário inseria informações como estado, cidade, metragem do terreno, área da construção, número de portas e janelas e detalhes específicos de alguns insumos. O sistema, então, calculava o valor dos materiais e o custo total da obra em segundos.
A solução de Vinicius era inovadora pela precisão e por resolver uma dor comum do mercado.
A maioria das construtoras fazia cálculos manuais via medições das plantas e dividia o orçamento em porcentagens pelo tipo de material. Esse processo, além de extremamente trabalhoso, poderia levar meses para ser concluído. E, mesmo assim, o custo final de uma grande obra ainda seria uma estimativa.
Como surgiu a ideia
Em meados de 2020, durante a faculdade de Engenharia Civil, Vinicius se apaixonou por inovação e empreendedorismo. Foi trabalhando em uma construtora local fazendo exatamente isso que veio o estalo: ele poderia criar algo para automatizar o processo.
Começou modelando tudo no Excel, testou e percebeu ter algo valioso nas mãos. Para levar a ideia adiante, trouxe um amigo para ser responsável pela tecnologia e foi buscar parcerias.
Com o apoio do Centro de Empreendedorismo da sua universidade e a aceleração da Wadhwani Foundation, começou a moldar a startup. O processo de validação durou um ano e meio e inclusive, seu TCC foi sobre o tema, consolidando todo o conhecimento adquirido.
Oferecer essa previsibilidade mostrou-se uma ideia promissora: ao final do programa de aceleração, ficaram entre os melhores. Algumas vendas também já aconteciam.
"Um dia eu acordava com a certeza de que ia ficar milionário.
No outro, batia aquela dúvida sufocante: será que estou só desperdiçando meu tempo?
Desafio de precificar e entender quem é o cliente
Um dos maiores desafios enfrentados foi a precificação e o motivo é um pouco inusitado: a Valor da Obra cobrava barato demais.
A solução era ágil, entregando dados valiosos em questão de segundos. Como a experiência de uso era rápida e de uma única vez, cobraram barato pensando na escala. O custo inicial? Apenas R$ 20.
Levou um tempo até compreenderem que as pessoas não viam valor e subestimavam o produto. Como confiar em algo tão barato para definir os custos de uma obra que valia centenas de milhares de reais? O preço miúdo fazia o resultado parecer pequeno também.
“Para uma obra de R$ 300 mil, nosso preço era insignificante. Na cabeça do cliente, isso não fazia sentido.
Preferiam pagar R$ 5, 10 mil para um engenheiro, acreditando que isso traria mais credibilidade.”
Vinicius pivotou para B2B, direcionando esforços para construtores e empreiteiros. Esses profissionais eram os responsáveis por uma obra e já tinham a confiança dos clientes.
Mas na prática, a Valor da Obra resolvia apenas uma parte do problema e estes profissionais solicitavam novas funcionalidades; como cronogramas físicos e financeiros.
Mudanças que demandam tempo e recursos. Uma virada era necessária para impulsionar o negócio….
Baixa velocidade em testar e avançar
“Se olhar para o que a gente fez, pelo tempo que a gente fez, foi pouco”
A Valor da Obra não tinha nenhum dos dois sócios em tempo integral.
Vinicius queria buscar investimento para garantir uma operação estável e destinava boa parte de suas horas limitadas para isso. Queria a segurança necessária para continuar aprimorando o produto.
Fez mais de 400 pitches. Não recebeu dinheiro, mas importantes feedbacks apontavam alguns caminhos.
No geral, os investidores gostavam da ideia e do timing: havia muito espaço para inovar na construção civil. Mas não entendiam porque a operação ainda parecia um projeto e não um negócio, principalmente por não ter ninguém mergulhado e 100% ali.
O modelo de negócio também não era tão complexo: a solução era boa, mas fácil, rápida demais para rodar e difícil de manter usuários ativos. Faltava a robustez de um ecossistema completo para planejar e gerir uma obra.
Aí algumas fichas começaram a cair.
“O pessoal abre uma startup e já pensa em investimento, antes mesmo de resolver a dor do cliente.
Também cometi este erro.”
Vinicius percebeu que a obsessão pelo perfeccionismo havia atrapalhado o ritmo. Se tem uma coisa que é aceitável no mercado da construção é uma considerável variação no orçamento. Mas focaram muito em diminuir a margem de erro do produto e essa precisão tirou toda a flexibilidade de criar outras funcionalidades.
O processo de desenvolvimento e validação de melhorias era lento. A coisa andava pouco pela baixa disponibilidade dos sócios.
Entenderam que o que tinham estava mais para uma feature do que um negócio em si.
Parando no meio do caminho
“Criamos uma feature que só fazia sentido em uma plataforma que já estivesse rodando”
No início de 2022, colocaram na balança a possibilidade de expandir a Valor da Obra, focando em buscar estabilidade e escala… ou encerrar o projeto.
Já haviam faturado aproximadamente R$ 20 mil, mas estava claro que o negócio precisava de uma estrutura maior para prosperar. Entraram no famoso "deserto de startups", com dificuldade em fechar novas vendas.
De um lado, havia demanda, mas empreiteiros e engenheiros pediam novas funcionalidades. Ainda era o primeiro aplicativo de viabilidade de obra existente - os concorrentes próximos eram mais focados em acompanhamento da construção.
Para entregar mais, precisavam de mais capacidade. Ou seja, gente para dentro do negócio.
O sócio focado em tecnologia, por razões pessoais, aceitou uma boa proposta de emprego e saiu do projeto. Vinicius também havia aceitado o convite para criar a área de inovação na Brasilseg um pouco antes.
Com outro foco, decidiram encerrar o projeto. As tentativas de vender a solução para outras empresas também não avançaram devido à demora nos processos de negociação.
Era hora de recomeçar.
Os aprendizados
O que você faria igual se fosse começar um novo negócio?
Buscar pessoas para ajudar. Seja através de mentores, universidades ou aceleradoras, buscar pessoas adaptadas a realidade do mercado, sócios com valores e princípios parecidos, entender que não dá para dar conta de tudo sozinho.
O que faria diferente?
Validar o tamanho do problema. No início, fizeram algumas pesquisas enviesadas que atrasaram a clareza do problema, solução e possibilidades de mercado. Também faria parcerias estratégicas mais cedo, que podem impulsionar o crescimento de forma mais rápida.
Vinícius recomenda este framework de validação e tentei desenhar aqui de forma didática, acrescentando novas sugestões abaixo da linha cinza.
Por que este framework importa?
Se você apostar em criar e aprofundar relacionamento com 50 clientes em potencial; já tem uma base significativa para validar problema e solução. Daí, podem sair as primeiras vendas e, acredite, isso já te coloca à frente de muita gente.
5 Erros ou conselhos
que daria para você hoje ou para quem quer cometer outras falhas; não as que estão nesta edição:
Ninguém aposta antes de você. A estratégia de captar e ter segurança para entrar de cabeça no negócio não convenceu. Investidores queriam ver os fundadores apostando antes de todo mundo.
Precificação está mais atrelada à credibilidade que se imagina. Precifique de acordo com a transformação que você oferece e com o valor percebido pelos clientes.
Tempo em produto antes de tempo em captação. Faça um produto bom, desejável e com perspectiva de crescimento antes de gastar mais tempo buscando investidor para fazer isso acontecer.
Mentores são atalhos para evitar erros. Ter buscado antes um mentor teria trazido mais clareza nos caminhos e possibilidades; como novas ideias de testes e possíveis parcerias.
Tempo de experimentação e teste rápido. Definir bem um cronograma de experimentação, testar e validar pode evitar cair neste deserto de vendas ou de falta de novidades para o cliente. Um dos maiores custos de uma startup é a lentidão.
O depois
“Não olho a Valor da Obra como uma startup de fato, mas sim como um projeto que trouxe aprendizado”
Vinicius encara essa experiência como uma grande escola, que consolidou sua paixão pelo universo da inovação e empreendedorismo.
Logo depois de encerrar a Valor da Obra, chegou a criar um novo projeto durante um Startup Weekend, focado em painéis de energia solar. Nos meses seguintes, ele navegou entre seu emprego e a nova startup. Quando convidado para ser CEO e se dedicar integralmente, novamente preferiu não arriscar.
Recordou-se dos desafios do projeto anterior, avaliou a responsabilidade de dedicar-se inteiramente a um negócio e a entrega total que precisa e percebeu que, novamente, não era o momento. Ser um bom empreendedor é também saber quando não arriscar e fazer escolhas mais conscientes.
Hoje, é estrategista sênior de inovação e inteligência de mercado na Brasilseg e, com entusiasmo, preside o Instituto de Formação de Líderes (IFL).
Conecte-se com Vinicius no Linkedin.
Obrigada pela generosidade em contar sua história e inspirar outros (as) empreendedores (as).
Tem muita vida após o ‘não chegar lá’, o problema é o processo. Espero que esta edição tenha inspirado um pouco.
Até a próxima história!
(Sigo em busca de novos casos para contar. Me indiquem, principalmente negócios de mulheres e/ou startups de base tecnológica! :) )
Nati.
Leia a edição #21 aqui.
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🔗 O que andei lendo e que pode inspirar você e seu negócio:
David Perell, um escritor que gosto muito de acompanhar, entrevista o fundador do ChatGPT Sam Altman e o papo traz bons insights sobre escrita (em inglês). ✍️
Sobre construir segurança psicológica e fomentar times mais tranquilos e focados no que importa. 🤝
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→ Esta história foi 85% escrita por inteligência real, não artificial. :)
Muito bom!
Obrigado pela menção, Nati! Sou fã demais do seu conteúdo! <3